Considerações preliminares

Para ter uma idéia geral, leia atentamente as considerações a seguir.
Sob os links estão dicas , figuras , planilhas ou calculadoras que ajudarão no entendimento do texto e no cálculo dos parâmetros.

Todo astrônomo amador sonha em ter um bom telescópio, mas conseguir um não é fácil. Bons telescópios são caros, têm que ser importados diretamente, pois não são produzidos no Brasil e os importadores trazem somente aparelhos de pequena abertura (50 ou 60 mm), qualidade óptica discutível e preços mais acessíveis para atender ao mercado leigo.
Com todas as dificuldades da importação, a saída mais honrosa é construir seu próprio telescópio.

O primeiro obstáculo é a construção da objetiva. A superfície que coleta a luz e a dirige para o foco, onde forma uma imagem real do objeto observado. Precisamos construir um refletor côncavo, espelhado na primeira superfície para fazer este trabalho.

Não podemos classificar este trabalho como uma tarefa fácil: é mais um desafio.
Mas alguns brasileiros precisam enfrentar este desafio para nos libertar da dependência tecnológica nesta área.
São imprescindíveis alguns conhecimentos de óptica, um pouco de matemática e mecânica, alguma habilidade manual, disponibilidade de tempo, dedicação, capricho e perseverança, mas o resultado é compensador.

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Para o astrônomo iniciante, as características desejáveis de um instrumento são:

Qualidade óptica

A mais importante característica de um telescópio é sua qualidade óptica. Um instrumento de óptica fina de 100 mm poderá ver detalhes que passarão despercebidos em um telescópio com o dobro desta abertura, mas com uma óptica de qualidade inferior. A nitidez das imagens, o contraste e os detalhes que poderemos observar estão ligados diretamente ao acabamento da objetiva do telescópio. Telescópios com melhor óptica custam mais caro, e valem o investimento. O astigmatismo, a aberração esférica, a aberração cromática ou defeitos na superfície da objetiva podem comprometer totalmente a imagem. Ao construir um telescópio, é você quem vai determinar a qualidade das superfícies ópticas, podendo ultrapassar os limites impostos pelo mercado aos telescópios amadores.

Abertura (D)

Abertura é o diâmetro da objetiva. Mais importantes que o número de aumentos que um telescópio pode dar, são o seu ganho de luz e o poder de separação ligados diretamente à abertura. Ganho de luz é a quantidade de luz que ele pode receber e concentrar na imagem. Este ganho é que nos vai permitir ver objetos escuros, como estrelas distantes ou de menor brilho, cometas, nebulosas e galáxias. O ganho de luz é diretamente proporcional à área da objetiva. O poder de separar dois objetos próximos, com no caso das estrelas duplas, é diretamente proporcional ao diâmetro da objetiva.

Distância focal (f)

É a distância focal que estabelece o tamanho da imagem gerada pela objetiva e o tamanho final do telescópio. Se a dividirmos pela distância focal da ocular teremos o número de aumentos do telescópio.

A relação focal f/D (distância focal dividida pelo diâmetro da objetiva) é que determina a luminosidade da imagem.

- Telescópios curtos (f/D ~3 a 6) são mais claros, indicados para objetos escuros, como nebulosas, galáxias e cometas.
- Telescópios longos (f/D ~15) fornecem maiores aumentos e são usados para a observação de objetos brilhantes, como estrelas, planetas, estrelas duplas e alguns aglomerados.
- Telescópios extra-longos (f/D 30~100) são usados exclusivamente para a observação do Sol.

Por este motivo, quase todos os fabricantes adotam uma relação f/D intermediária entre 8 e 12, para que o aparelho tenha um campo de utilização mais amplo.
A relação focal ainda determina o limite para nos livrarmos da aberração esférica das objetivas. Telescópios curtos terão que ter forçosamente espelhos parabolóides, de construção mais difícil que os esféricos.

Montagem

Uma montagem instável pode tornar impossível o uso de um bom telescópio. Perde-se mais tempo tentando apontar o aparelho que observando. Para observações de campo é melhor usar uma montagem altazimutal simples e estável que uma montagem equatorial.
A montagem equatorial
só é usada em instalações fixas, para observações longas e fotografias porque seu alinhamento com o pólo é trabalhoso e demorado e se justifica quando equipada com um mecanismo de acompanhamento. Uma montagem cheia de recursos e regulagens mas instalada sobre pés sem rigidez ou mal alinhada com o pólo torna-se um estorvo.

Portabilidade

Como a maioria de nós está confinado ao meio urbano, nosso céu é comprometido pela poluição do ar, seja ela por poeira, fumaça ou pela própria iluminação pública. Assim somos obrigados a nos deslocar para áreas rurais para conseguir um céu escuro e límpido. Transportar um telescópio pode se tornar um obstáculo para o astrônomo amador. O telescópio tem de ser leve, robusto, fácil de montar e desmontar no escuro e com poucas peças que possam extraviar.
A portabilidade está diretamente ligada ao número de observações realizadas: é mais fácil levar um telescópio leve para fora.

Preço

Um bom telescópio pronto nunca é barato. Desconfie dos telescópios baratos, ou sua óptica é deficiente ou o dono não sabe seu valor. Mas se nos dispusermos a construir um, nosso grande investimento será de conhecimento, tempo e trabalho, o que, para muitos de nós, se torna uma tarefa agradável e gratificante.
Você irá investir entre 100 e 150 reais no material necessário.

A escolha

O projeto de um telescópio deve levar em conta todas estas variáveis, e para cada caso, devemos escolher o melhor equilíbrio entre os objetivos desejáveis e os recursos disponíveis.

Vamos construir um telescópio newtoniano , com um espelho esférico de 130 mm de diâmetro, f/D = 8, e uma montagem altazimutal desmontável.

Por que o Newtoniano?

Porque é o telescópio que nos dará a melhor relação custo/benefício.
É um telescópio
simples de excelente desempenho e fácil construção, onde o espelho primário (objetiva) é montado no fundo de um tubo e usa um pequeno espelho diagonal (secundário) que desvia a luz para fora do tubo. Tem este nome porque foi criado por Sir Isaac Newton, o grande físico e matemático inglês. Apenas uma superfície da objetiva precisa ser polida (num telescópio refrator são quatro). Como não há refração, não apresenta aberração cromática: a luz é refletida no espelho. Não precisamos de vidro óptico, já que a luz não atravessa a objetiva.

O diâmetro está limitado pelo vidro comercial de 16 mm de espessura que encontramos nas lojas e pelo grau de dificuldade que o iniciante terá de enfrentar. O limite de flexão para espelhos maiores exigiria blocos mais espessos, que não são disponíveis no Brasil, as dificuldades no polimento aumentariam muito e células especiais teriam de ser usadas. Uma objetiva de 130 mm nos dá um ganho de luz 340 vezes maior que o olho humano. Poderemos ver estrelas de 12ª magnitude e seu poder separador será de 1 segundo de arco.

A relação focal f/D = 8 (distância focal dividida pelo diâmetro da objetiva) nos dá a máxima luminosidade para um espelho deste diâmetro sem problemas com a aberração esférica . Espelhos mais curtos seriam obrigatoriamente parabolóides, de construção mais difícil. Distâncias focais maiores aumentariam o tamanho do aparelho, reduzindo a sua portabilidade.

A montagem altazimutal é a mais adequada e de operação mais fácil para trabalhos de campo. Pode ser facilmente desmontada e transportada num carro pequeno. A montagem será feita num tubo de PVC de 150 mm, fácil de ser encontrado no comércio, leve, flexível e resistente a choques.

Vamos enfrentar este desafio ?

Para começar o trabalho, vamos precisar comprar dois pedaços de vidro de 16 mm de espessura de 15 x 15 cm, um bocado de carbureto de silício #80 e uma pedra de afiar. Não é necessário que o vidro seja novo. Alguns amadores conseguem retalhos na sucata das vidraçarias que são vendidos a quilo, ou na desmontagem de lojas, onde são usados como piso ou mesas. Se você não conseguir o vidro escreva para nós!

A construção de um espelho de telescópio envolve basicamente cinco operações, além do corte, com tolerâncias dimensionais cada vez mais estreitas. Para atingir a estes objetivos vamos fazer o polimento usando abrasivos de granulometria cada vez menor e maior rigor nos procedimentos:

Operação Abrasivo Tolerância
Corte #80 1 mm
Desbaste #80 0,1 mm
Ajustagem #220 - #500 0,01 mm
Lapidação #1000 - #1500 0,001 mm
Polimento rouge 0,000 1 mm
Retoque rouge 0,000 05 mm

Cada uma desta etapas será discutida mais detalhadamente com o objetivo de obtermos um espelho com um acabamento de 1/10 do comprimento médio de onda da luz visível (l= 0,56 mm) ou seja, tentaremos limitar os erros medidos na frente de onda a 0,056 micra, ou 56 nanômetros.